quinta-feira, abril 26, 2007

A sul do Rio IV, as ervas e as pedras






Entre ver os rios Paiva e Caima e os inúmeros ribeiros cantantes, a serra da Freita oferece-nos o seu sorriso na Frecha da Mizarela, uma queda de água (aqui, Agosto 2006 com pouca!) com 60 m de altura.

Deambular pelos adros das capelas seculares, inventariar os, ainda, sinos que cantam, desejar ir às aldeias tradicionais, tantas, à deriva no tempo e de nomes surpreendentes, levantar a cabeça para as torres e pelourinhos, picar as pernas no mato para chegar mais longe e espreitar donde vem o cantar do pássaro. Descobrir a mamoa da Portela da Anta, o memorial de Santo António e a Torre dos Mouros.

As "pedras parideiras" - afinal o que me fez levantar a laje e entrar na gruta da memória - é um fenómeno que dizem ser único no país e raríssimo no mundo. Ficamos contentes por termos, além de fenómenos mais conhecidos e paridos por aí à desgarrada, estas pedras protegidas, na região de Castanheira. O espaço foi vedado para evitar que as pedras se esgotem em recordações de estante.

É um "afloramento granítico que tem incrustados nódulos envolvidos por uma capa de biotite, em forma de disco biconvexo". Pela erosão, soltam-se da pedra-mãe daí o nome que lhe é dado. Um parto que terá demorado milhares/milhões de anos. Acho este assunto diverso uma delícia!

Seguindo os passos da evolução da Terra, descobrem-se ainda os enormes fósseis marinhos, trilobites com mais de 450 milhões de anos, pelo que dizem, exemplares raros do planeta na era Paleozóica.
Hei-de voltar. Passo à frente o que vi e procuro outro ângulo, no cruzamento tomo outro caminho. Uma necessidade imensa, como uma sede interior, de ver.

quarta-feira, abril 25, 2007

A sul do Rio III - O Mosteiro










A construção do Mosteiro dedicado a S. Pedro, é reportada ao sec. X. Desde que a infanta D. Mafalda, filha de D. Sancho I, ali professou por volta de 1217 ou 1220, iniciou-se um período riquíssimo para a história do seu admirável espólio.
As meninas da nobreza que entravam no convento, levavam enxoval próprio, os seus dotes de terras, riquezas, mobílias e até criadas, para o noivado com Cristo. A infanta D. Mafalda foi beatificada, conservando-se a urna/relicário em ébano, cristal, prata e bronze, à vista, na Igreja do Mosteiro.
Sem pretensões de dar (ou receber) lições, sirvo-me unicamente destes dados para ilustrar as fotografias e os aspectos relevantes duma visita em detalhe. A compreensão das imagens está ligada a estes ciclos de vida.

Por exemplo: como viviam em clausura as freiras tinham em espaços comuns a representação, em azulejos, da vida secular, naturalmente filtrada pelo sagrado a que estavam devotadas. Doceiras de qualidade, estão agora recuperadas muitas das receitas dos mimos de então. As castanhas e morcelas doces, o manjar de língua, as roscas e charutos de amêndoa ou as barrigas de freira (Honni soit qui mal y pense!).

Em evidência na Igreja, além dos habituais motivos religiosos e um orgão lindíssimo, vê-se um cadeiral, em duas filas, esculpido e encimado por pinturas emolduradas por uma rica talha barroca.

Imponentes e dum valor artístico precioso e raro, são as peças reunidas e expostas no Museu de Arte Sacra, uma das melhores colecções do género em ourivesaria, pintura, mobiliário, peças de uso litúrgico, manuscritos, livros religiosos e tapeçarias.

Donde sairei com os olhos em regalo e arregalados de imponência, ansiando a vista dos montes, em quase beatitude.
Espero o milagre da terra que me compensará da vacuidade dos seres humanos e as suas exuberantes - neste caso, lindas - expressões de vaidade.

Festa em Abril 1974

(Foto de FM)


Por ter vivido alegremente o 25 de Abril de 1974.

Por amigos meus terem podido voltar a casa.
Porque o meu filho não foi obrigado a ir para a guerra.
Festejar a Liberdade, SEMPRE!

segunda-feira, abril 23, 2007

A sul do Rio II - Arouca








Lugar povoado desde tempos remotos, pelos vestígios pré-históricos encontrados, os Romanos fundaram ali uma cidade com o nome de Arauca ou Araducta. No séc. VIII da nossa era, foi destruída pelos Árabes.
D. Afonso Henriques (sempre ele, conquistador e estabilizador!!!) concedeu-lhe foral em 1151.

Da cidade, os cantos de história, recolhidos sem qualquer preocupação a não ser a estética ou a monumental, fazem-nos esquecer que estamos em mais uma terra do interior.
Há um certo ar desafogado naquele lugar, decerto pelos ventos e odores que lhe vem das serras que a abrigam.

A sul do Rio I








Quando nós falamos de rio é, aqui, sempre o Douro. Que nos divide e junta. Andaríamos a vida toda a falar dele; a essas águas abraçando os montes voltarei porque delas vim.
Tantos os lugares de passos passados.

Saíamos com esforço por causa do calor de Agosto. Incêndios nesta terra abençoada de verdes. Mas o mês de "todas as senhoras" é também o tempo de quem está fora matar a nostalgia de dentro. Vivendo nos seus mundos regulados por outros padrões de qualidade, os que chegam vêem a vida barata, a boa comida e o primitivismo de terras e gentes, como o paraíso.

Não os traremos para as neves ou granizos, os caminhos dos bois, as derrocadas das pontes, os velhos que morrem à lareira.
Levámo-los às pedras que bolem e cantam, aos brasões arruinados, à vitela barrosã, aos doces tradicionais.

Damos-lhes uma garrafa de Vinho do Porto como recordação: e com os vapores doces do nosso "vinho fino", verão com olhos coloridos a realidade.
Tantas vezes analfabeta e ingénua, precária e dura, a realidade do país que deixamos fazer e donde eles fugiram.

Arouca terá sido edificada uns 500 anos antes de Cristo. Na cidade e no Mosteiro dela, nos vales e na serra da Freita, passearemos acompanhados e espreitaremos tanto o místico como a natureza.
Um rio maior chamou os seus pequenos filhos, afluentes a sul. E eles correram para Norte, cristalinos como jovens, entre as serranias da Freita, da Arada e do Montemuro, até encontrarem a veia jugular dum rio masculino: o rio Douro.

(Porque a Mena está ausente e gostará; porque a Meg está mais perto e recordará.)

sexta-feira, abril 20, 2007

No title

Hoje não há fotografia que me valha! Só se fosse a da "Múmia" toda enfaixada e com frestas de olhos.
Envergonhada. Por não gostar, por não simpatizar. Desde ontem que penso. Habitualmente penso mas desta vez penso que alguém pensou em mim. E eu não sei que fazer.
Três amigos nomearam-me para não sei que troféu tipo americano, um "Award de Pensar", o que ainda me afligiu mais. Vou ser obrigada a pensar sempre, a produzir pensamentos. Ainda por cima pensamento válidos, interessantes, apelativos.
Ora eu que penso como respiro e não quero obrigar os pensamentos a entrar no curro, a não ser que eu esteja disposta ... (e quantas vezes eu: "Ei, pensamentos!" e eles relutantes...)
Ora eu que desapareço atrás da porta e é que não conheço ninguém
(lembro-me do outro, do Frei Luís de Sousa: "Quem és tu?" tam tam tam tam: "Ninguém!")
Eu, simples flor campestre, ou melhor dizendo
- uma orquídea citadina, daquelas armadas que vêm em caixas, de avião, e climatizadas.
Eu que não me distingo entre centenas (e até só comecei há 11 meses, fico de boca aberta com pessoal da pesada que celebra aniversários quase como bodas de prata - ai, eu acho bem e digo tchim tchim, fico espantada mas contente por tanto movimento se basear em nada, quando há tantos movimentos que deveriam cair pela base e não caem).

Enfim, obrigada, mesmo a

- Bomdiaisabel, de lá longe e tão perto, mulher de vários nomes começados por A!!! Adorável...
- S de Diafragma (elemento masculino que muito me honra com as suas chapas)
- A MManuel do Charlas (que já foi máscara azul e gosta de portas como eu) - e vinho fino

Prontos, só ligo ao facto de terem sido estes três seres especiais que me mandaram o repto, com muito mérito deles e meu, eles saberão coisas que eu não sei...

E depois há quem venha pela porta do lado e comente, queridas vénias - e quem venha pela porta do quintal tomar capilé comigo e cochichar... Todos os que vierem por bem.

Preciso é explicar que odeio concursos, todos. Competição. Publicidade, blá, blá, blá
...e sobretudo Awards que me faz lembrar todos aqueles velhotes dos Óscars, combinados nas falas e nos fatos ( e há filmes que são bons mas eu desconfio sempre do tio Sam, às riscas e de dedo em riste) .
Tenho é de dizer que tenho - mais ou menos - a absoluta - mais ou menos - noção do meu tamanho (um metro e 65) e do meu comprometimento com a Beleza e o Pensamento.
À medida que vos vou desfiando, os contos, as fotos, as pequenas palavras como ramos de cheiros.
Pessoas que eu acho queridas, a escrever ou a mostrar que escrevem. O que pensam e o que nos fazem pensar, muitos são! Com as suas solidões por vezes tão espelhadas. Como poderia relevar 5? Cinco no meio de dezenas? Não seria sincera. Seria pontualmente sincera e não quero relógio de ponto.
Tu que me lês, se por acaso sorris, sabes a quem me refiro. Tenho passado no teu sítio e tenho sido correcta e sincera nas apreciações. Digo gosto, é verdade. Se não gosto, cumprimento e desapareço.
Foi assim que sonhei o meu jardim. Um portãozinho de ferro forjado que está suficientemente velho para ranger e me indicar quem entra.
Também tenho "espanta-espíritos" pendurados. Se não for pelo som, sinto o movimento.

Companhias. Disponíveis. Afectuosas.
Muito obrigada, espero poder, e querer, continuar...
Mas em verdade vos digo que não chegariam os 10 dedos das minhas mãos (e agora estão ocupados aqui) para contar as almas doces, almas paralelas ou simplesmente almas que aqui encontrei e que me prezo de AMAR!

quarta-feira, abril 18, 2007

Ainda o Jardim de Guerra Junqueiro




Recolhi "O Melro". O meu preferido pela ternura e lição de liberdade.
Duma inocência terrível e todavia comovente.
Penso em todos os animais que acompanharam o meu tempo de ser pequena, animais reais e animais sonhados.

Este melro-mãe vivia nos meus segredos infantis, tão real como as fadas e as princesas, os sapos e as raposas, o que imaginava na natureza à solta.

O poema é demasiado extenso para este lugar artesanal mas eu não resisto a arrancá-lo, aos bocados, das páginas de um livro fechado há tanto tempo:

"O Melro"

O melro, eu conheci-o:
Era negro, vibrante, luzidio,
Madrugador, jovial;
Logo de manhã cedo
Começava a soltar, d'entre o arvoredo,
Verdadeiras risadas de cristal.
E assim que o padre-cura abria a porta
Que dá para o passal,
Repicando umas finas ironias,
O melro, d'entre a horta,
Dizia-lhe "Bons dias!"
E o velho padre-cura
Não gostava daquelas cortesias.
...
E o melro no entanto,
Honesto como um santo,
Mal vinha no oriente
A madrugada clara,
Já ele andava jovial, inquieto,
Comendo, alegremente, honradamente,
Todos os parasitas da seara
Desde a formiga ao mais pequeno insecto.
E apesar disto o rude proletário,
O bom trabalhador,
Nunca exigiu aumento de salário.
...
(depois dos pequenos melros terem sido aprisionados numa gaiola, a mãe:)
...
"Quem vos meteu aqui?!" O mais velhito
Todo tremente, murmurou então:
"Foi aquele homem negro - Quando veio
Chamei...chamei...Andavas tu na horta...
Ai que susto, que susto! ele é tão feio!...
Tive-lhe tanto medo!...Abre essa porta,
E esconde-nos debaixo da tua asa!
Olha, já vão florindo as açucenas;
Vamos construir a nossa casa
Num bonito lugar...
Ai! quem me dera, minha mãe, ter penas
Para voar, voar!"
...
"Meus filhos, a existência é boa
Só quando é livre. A liberdade é a lei,
Prende-se a asa, mas a alma voa..."
...
(ao vê-los mortos por bagas de veneno que lhes deu a mãe, o padre:)

E, arremessando a bíblia, o velho abade
Murmurou:
"Há mais fé e mais verdade,
Há mais Deus com certeza
Nos cardos secos dum rochedo nu
Que nesta bíblia antiga... Ó Natureza,
A única bíblia verdadeira és tu!..."

"A Velhice do Padre Eterno" de Guerra Junqueiro.
E tudo veio dum Jardim de Lisboa, poemas agarrados com as redes largas do pensamento.

terça-feira, abril 17, 2007

No jardim, recordo o poeta




Pelo caminho da infância, lembrei o poeta e o livro "A Velhice do Padre Eterno". Guerra Junqueiro. A edição que havia em casa era antiga e excomungada, certamente. As figuras deliciavam-me a imaginação: serpentes, mundos, frades anafados de hábito, um Deus antigo de longas barbas e ar prazenteiro.
Figuras de Bordalo Pinheiro em poemas poderosos.
Anti-clerical, profundamente moderno na sua apreciação, Guerra Junqueiro ainda hoje me faz rir com as suas ladaínhas:
"...
Santa Intrujice - entrega as almas toscas
Santa Intrujice - às nossas artimanhas...
Santa Intrujice - Deus destina as moscas
Santa Intrujice - a papo das aranhas.
S. Venha-a-nós - realiza este desejo,
S. Venha-a-nós - ingénuo e timorato:
S. Venha-a-nós - faz do universo um queijo
S. Venha-a-nós - e faz de nós um rato!
..."
(Atrevo-me a pensar nas multinacionais e no seu credo!)
Para a noite, a ironia do medo:
"O Papão
As crianças têm medo à noite, às horas mortas,
Do papão que as espera, hediondo, atrás das portas,
Para as levar no bolso ou no capuz dum frade.
Não te rias da infância, ó velha humanidade,
Que tu também tens medo ao bárbaro papão,
Que ruge pela boca enorme do trovão,
Que abençoa os punhais sangrentos dos tiranos,
Um papão que não faz a barba há seis mil anos,
E que mora, segundo os bonzos têm escrito,
Lá em cima, detrás da porta do infinito!"
Voz forte e sarcástica, imagino-o hoje a ser declamado no belíssimo coreto do jardim. Os seus poemas são para ser lidos em voz alta e de alto.
E que actual seria.

Partilha e devaneios





E sobre "Partilha", as pequenas tartarugas do Jardim da Estrela.
Dividindo o espaço e o sol.

Como se tornou assim estranha uma palavra que tem sido um contínuo acto?

Parti (r) (i) lha (ar) ... Partir ou partilhar a ilha?

Figura (r) - figu(rar)... figurativo?
"Andar" por exemplo, como figurar o "andar"? Ando com os pés, as pernas.
Ando com os sentimentos.
Ando com o que corro e vejo, pensando. Ou penso e vejo, enquanto corro.

Andei nos livros e também nos campos. (Per) corridos. (Des) figurada.

Visto-me destes véus inquietos que esvoaçam enquanto escrevo e me disfarçam de mim.
Onde pousei os olhos e o corpo?
Onde parti ou reparti?
Onde cheguei?

Que lago e em que jardim ou ilha?

quarta-feira, abril 11, 2007

Museu e Brilho

Vista geral do Museu Guggenheim de Bilbau (Wikipédia)


"Maman" - escultura aranha por Louise Bourgeois

"Puppy" de Jeff Koons





Este estranho "Centro" que deixei no PPP. Escultura que pode ver-se na primeira foto (Wikipédia) e nesta, ao fundo à esquerda.
Aranha do tempo, como contraponto à luminosidade e brilho em todo o sítio onde nasceu o Museu Guggenheim, Bilbau, Espanha. Sei que o arquitecto canadiano Frank Gehry escolheu um sítio abandonado de velhos edifícios, olhou-o do alto e disse: "ali!".

Como todo o espaço parece um navio/estrela onde, em vez da nudez da pedra e aço, se reflectem espelhos de água, sítios abertos de sentar e flores domesticadas... LUZ.

A ver, pelas exposições, pela arquitectura.

Mas sobretudo por todo o ambiente de paz inovada em que o Museu barco deixa respirar o rio.

segunda-feira, abril 09, 2007

Subir


Esta gente tão querida que aqui passou, com ramos de Páscoa e bons desejos.
Deixo um fundo
(de onde é preciso subir).

Certo que lá no alto há uma torre e vista larga. Acariciar olhos...

Porque me é espantoso ainda (re)conhecer pelo gosto os que aqui se movem comigo.
Um obrigada a cada um, particularmente, porque cada um é diferente.